sábado, 13 de dezembro de 2008

Somos Todos Calhordas Molhados

Chovia pra cacete quando coloquei o nariz pra fora do escritório. Protegido pelo sobretudo e envolto pelas piadas sem graça do zelador desdentado, enfrentei o dilúvio e comecei a caminhar em direção à cena do crime. Três quadras sob a chuva torrencial me colocariam no lugar. Além disso, tinha muito no que pensar, pois nada daquele caso fazia sentido. E isso mesmo com o pagamento adiantado e aquele diálogo pra lá de libidinoso com a mensageira de cabelo Chanel preto e olhos negros como os pensamentos do próprio Ceifador. Com o “How many more times” do Led Zeppelin por única companhia nas ruas desertas e alagadas de Beta-Siridó, pensei em largar tudo, comprar uma passagem para bem longe, e desfrutar das últimas semanas de um verão particularmente violento e encorajador. Mas aquilo seria uma besteira, além de nem um pouco profissional. Apesar da pressão do dia-a-dia, eu ainda encontrava certo prazer e alguma redenção em meio a cadáveres, mulheres fatais, capangas sem nome e o mais que manjado jet-set alienado e condenado.
Tais pensamentos, entretanto, foram violentamente interrompidos pela aparição repentina de Joe “Repolho” Brooks, um detetive da Zona Sul conhecido por seus métodos dignos de um carrasco nazista.
“Ora, ora, se não é o grande Padawan Marcuse. Que tubulação de esgoto te trouxe até aqui?”
Brooks não ia muito com a minha cara, e o sentimento era recíproco. De qualquer maneira, eu não perderia a deixa nem por um decreto.
“A mesma que instalaram no útero da tua mãe, Brooks...”, respondi.
Bons ou ruins, detetives particulares e demais tipo de respeitáveis carniceiros raramente saíam no tapa uns com os outros. Sorte de Brooks, que teria levado a surra de sua vida. Sorte minha, que teria sujado as mãos com um crápula daqueles. Azar nosso, pois seria a melhor maneira de evitar mais uma cena do crime envolvendo um traficante argelino, uma prostituta sexagenária e um jovem diplomata viciado.
Mais um caso na fétida metrópole de Beta-Siridó.
Nada de mais para um sujeito como eu.

Um comentário:

Anônimo disse...

Não tinha lido esse blog ainda - qtos vc tem, btw ?!? - e o tamanho e a variedade da sua criatividade não param de me impressionar...

(e isso foi um elogio)

bjo, T.